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A IMPROVISAÇÃO MUSICAL
Dr. Levi Leonido da Silva         

Improvisar em alguns casos, requer um obedecer a determinadas regras estabelecidas por padrões clássicos, como no caso do jazz tradicional, em outros casos é sinónimo de experimentação e descoberta, sendo posteriormente um caso raro de criatividade, ou seja, a criação de algo novo.

         Vivemos num mundo onde criar no sentido absoluto, constitui um milagre, mas a improvisação aliada à inspiração, pode ser um novo fôlego à criação e ao desenvolvimento de novas tendências, sejam elas regeneradas, Inventadas ou simplesmente remexidas. A improvisação individual ou em grupo, tem e teve ao longo de toda a História da música um papel fundamental, pois de acordo com o que diz R. Allorto (1989:81):

«A improvisação ocupa um espaço considerável, embora não conste, precisamente por que se registava por escrito. Teve sempre muita difusão entre os povos primitivos, como aconteceu de resto também com o canto gregoriano, com a polifonia de Quinhentos (o chamado «Contrapunto alla mente»), nas fioriture e CADÊNCIAS da música barroca e na álea de certa música contemporânea».

         Sabemos que no Barroco e no Romantismo principalmente, mesmo no classicismo os compositores proporcionavam espaços destinados à livre expressão do executante – intérprete (as cadenzas).

         Por definição, a improvisação é, para o mesmo autor (1989), uma composição extemporânea, elaborada in loco por um ou mais fazedores de música. Normalmente, improvisa-se sobre um tema, uma qualquer melodia, uma qualquer sucessão de acordes, mas também tendencialmente sem qualquer ponto de partida preexistente.

         Para a pedagoga e virtuosa professora de música, Violeta H. de Gainza (1986:54), este tema:

«Contempla duas formas fundamentais de improvisação: a brincadeira musical buscando apenas a livre expressão e a “profissional”, onde se espera um resultado estético».

         Ainda para a mesma autora e pedagoga ilustre, improvisar é no sentido mais amplo, sinónimo de brincar musicalmente. Esta acção revestida amplamente pelas componentes lúdicas, não deixa de constituir um facto expressivo válido, venha de onde vier a sua motivação (inventar ou copiar, entre outras, simplesmente experimentar). Pese embora que num sentido mais limitado de índole profissional, a improvisação é uma actividade grandemente submetida a diversas regras, tanto ao nível interpretativo (aspectos técnicos e expressivos da execução) como mesmo à real capacidade criativa (que determina a selecção, organização e manejo de materiais musicais) do músico ou instrumentista que a executa.

         Para T. Borba e Lopes Graça (1996:4), há duas espécies de improvisação:

«A que se baseia numa forma precisa, a fuga naturalmente; em que foi exímio J. S. Bach, e a improvisação que se desenvolve com certa liberdade de movimentos, sob impulso directo da imaginação, numa sucessão rápida de elementos, ligados entre si, e no conjunto, por princípio de unidade, naturalmente indispensável em toda a obra de arte».

         O improviso é, simplesmente uma etapa da composição espontânea, realizada e concebida sem prévia preparação. Actualmente alguns historiadores da música entendem por improviso uma qualquer composição instrumental, na forma clássica do Lied ABA (improvisos de Schubert, Chopin e Heller).

         Nem todos os músicos têm a capacidade de improvisar com frequência e desembaraço, pois não é regra geral, todos os músicos terem aprumada a aptidão de imaginação pronta, para além de terem de possuir uma memorização feliz e uns perfeitos conhecimentos de técnica necessários para se tornar um bom improvisador. No Irão e na Índia do Norte, tal como refere Vinko Globokar (2000:15):

«Não há separação entre o músico executante e o improvisador: todo o músico improvisa – seja sobre regras estritamente determinadas, seja como parte de um ritual de meditação».

Porque saber improvisar, para nós, constitui um profundo conhecimento da proposta musical do autor/compositor, necessitando de ouvir por “entre as notas”, escutar a intenção de cada frase, perceber o sentido de cada acorde, descodificar o significado de cada cadência, no fundo é fruir da intimidade do texto / obra musical. 

         O acto de improvisar, necessita implícita e explicitamente uma capacidade risco efectiva e alargada à experiência profissional do executante – intérprete. Para Paulo Freire, citado por Edson Passetti (1998) logo que exista a possibilidade de ser ou fazer algo, assume-se necessariamente um risco que, sem o qual não há criação artística, científica ou criação de qualquer espécie. Evitar o risco é resignar-se a repetir o que já foi feito, é conformar-se com a impossibilidade de romper horizontes e de não desafiar a própria criação em si.

O músico quando improvisa, sendo possuidor de grande fluência técnica e teórica, tem necessidade de antecipar o momento seguinte. Este tipo de aprendizagem resulta de um processo activo onde o indivíduo constrói novas ideias ou conceitos a partir do conhecimento que ele já adquiriu através de diferentes situações e experiências… selecciona e transforma as informações, constrói hipóteses e toma decisões baseadas numa estrutura cognitiva (esquemas ou modelos mentais que organizam e dão sentido às experiências e permitem que o indivíduo vá além da informação recebida.

         Cabe então ao professor, desencadear uma sucessão de comportamentos, despertando a curiosidade e sensibilizando os discentes a arriscar na criação, experimentação, improvisação, a partir da capacidade própria de se “espantar”com a descoberta de algo (teoria do “espanto” de Freire). Quem se espanta, está atento e disponível para aprender. Para Freire, sem espanto não há ciência, nem criação artística, sendo que o espanto revela efectivamente a busca do saber.

         Nesta busca de saber, deparamo-nos com um enigma grandioso, o qual passamos a apresentar: Porque razão é que um músico profissional, em alguns casos com experiência de décadas, paralisa quando lhe pedimos para improvisar? Simples, foi desenvolvendo uma ideia na sua cabeça e no processo de trabalho musical, de que pode ser bom executante, mas é incapaz de fazer música. O sintoma é conhecido, mas a causa ainda é imprevisível, pese embora poderemos apontar para uma solução, o medo de tentar e de errar. O que seria bom, era juntar o prazer de executar e sentir a música com o prazer da composição e da mensagem a ditar, seria um processo mútuo francamente saudável e próspero, com certeza.

         Para M. Schafer (1986:23):

«Potencialmente, todas as músicas foram escritas para todas as pessoas».

         Portanto todas as pessoas são capazes de compreender e por sua vez, desde de acompanhados e orientados nesse sentido, de fazer música.

         A vertente pedagógica deste tema, tem como pano de fundo os seus objectivos basilares, ou seja pretende-se que a aula tente, segundo V. Gainza (1986) despertar interesse e permita/alimente a reflexão. O resultado esperado da educação é um aluno motivado, que vai ter acesso à informação disponível, apropriar-se dela, digeri-la e metaboliza-la.

         Portanto um indivíduo com esta formação deverá estar preparado a ir requestar o que já foi feito (pesquisa) e o ainda não foi feito (criatividade). Kodály dá preponderância significativa à improvisação no seu método activo de ensino de música. Segundo ele será indispensável que o discente tenha uma vivência com prazer na usa actividade educativa. Para um estudioso, precisamente na introdução da metodologia ou Método Activo de Ensino de Música de Zoltan Kodály, nomeadamente António Yepes (1988:6) refere que:

«É claro que esta prática deve ser desenvolvida harmoniosamente, sendo cada aula uma verdadeira reunião musical da qual os alunos devem participar com gosto e interesse».

Somente com prazer e gosto por sentir, ouvir, tocar e fazer música, seremos capazes de desenvolver uma Educação Musical adequada e capaz de incentivar e munir os discentes com as ferramentas necessárias à realização plena da improvisação, da criação, da composição, entre outras formas de expressão congéneres a estas. Citando Robert Jourdain (1977:22) acerca da temática em questão, afirma que:

«Quando vislumbramos um fragmento de melodia na canção de um pardal (que certamente não teve a intenção de criar música para ser ouvida) … é o nosso cérebro e não o dele que descobriu uma oportunidade para ser musical».

A partir daqui pode nascer uma obra musical de universal valor, dando importância a todos os passos da composição (incluindo a improvisação como a expressão mais livre e espontânea de composição), neste caso sugestionada ou previamente induzida por um determinado tipo de inspiração (material de trabalho), a melodia do pardal. Sendo que uma das práticas lectivas, subordinada a este tema, tem como sustentáculo inicial a recolha de elementos sonoros das proximidades do local onde se desenvolve a leccionação, e desse material, pode resultar numa aula viva de improvisação sobre os referidos motivos (musicais ou extra-musicais).

         Manifestamente, a Educação Musical tem por objectivo, nem que seja em última instância, levar o discente a fazer música. O caminho para a fazer e para aprender os conceitos elementares requeridos, até chegar à maturidade de compositor, cada discente e cada professor têm o seu ritmo e o seu caminho a trilhar, segundo as suas vocações, as suas disponibilidades, entre outras.

Partindo do princípio geral de que todo o indivíduo é detentor de um grande potencial criativo e musical, é tarefa do professor facilitar e orientar o acesso ao mundo da música e aos seus segredos, recriando conhecimento e convocando/convidando o aluno a fazer o mesmo. Porque é óbvio que uma das funções da Educação Musical, deverá conceder ao discente a possibilidade de explorar desafrontadamente o mundo dos sons e de expressar com naturalidade as sua próprias ideias musicais, usando a linguagem musical de forma criativa aliada ao prazer da improvisação, como efectivo e espontâneo meio de composição, como atmosfera propícia de experimentação. Sendo assim, a criatividade, a invenção e a improvisação, constituem pedagogicamente instrumentos valiosos e indispensáveis para o desenvolvimento global do ensino da música, dentro de um prisma que aborde a improvisação como composição instantânea, jogo lúdico com os sons livres e um exercício pleno de musicalidade.

De referir que, um atrevido improvisador musical desprovido de competências / habilidades técnicas para tal, pode não passar de um “musicastro” (mau músico) que constantemente “musiquea” (faz música má, sem arte, sem espírito e sem graça), o qual reduz a sua vivência musical à criação de “musicatas” (Sol-e-dó improvisado, pretexto para bailarico) e atreve-se a ser unilateralmente um eterno e simples “musiquim” (aspirante a músico).

O caminho da improvisação, na nossa opinião, divide-se me duas vertentes fulcrais: 1. A vertente lúdica (área de intervenção pedagógica adstrita à expressão musical, mais acentuadamente no domínio da experimentação musical); 2. A vertente profissional (baseado em regras rígidas de técnica musical as quais se repercutem directamente na interpretação / performance final da dita improvisação). Felizmente existem seres humanos que têm o privilégio de, sem qualquer obstáculo técnico ou teórico, poder experimentar as duas vertentes… os profissionais.


BIBLIOGRAFIA PRINCIPAL
      

ALLORTO, R. (1993) ABC da Música. Convite à Música, Edições 70: Lisboa.BUTTERWORTH, Neil & Anna (1996) 400 Aural Training Exercises from the Masters. Novello Publishing Limited: London.

CHAILLEY, J. & CIW-LAN, H. (1947) Théorie Complete de La Musique: Vol./, lI. Alphonse Leduc: Paris.

DOUGLAS M. (1962) Guia dos Estilos Musicais. Convite à Música, Edições 70: Lisboa.

DUFOURCQ, N. (1988) Pequena História da Música. Convite à Música, Edições 70: Lisboa.

FREIRE, P. (s.d.) Educação como Prática de Liberdade. Dinalivro: Lisboa.

GAINZA, Violeta Hemsy de (1983)  La improvisacion musical. Ed. Ricordi: Buenos Aires.

GLOBOKAR, Vinko (s.d.)- Reflexiones sobre la improvisación (texto de autor)

JOURDAIN, Robert (1997) Música, Cérebro e Êxtase. Ed. Objetiva: Rio de Janeiro.

GRAÇA, Lopes; BORBA, Tomás (1999) Dicionário de Música. Mário Figueirinhas Editor: Porto.

MED, Bohumil (1996) Teoria da música. Musi Med: Brasília.

NACHMANOVITCH, Stephen (1993) O poder da improvisação na vida e na arte. Summus Editorial: São Paulo.      

OSTROWER, Fayga (1987) Criatividade e Processos de Criação. Ed. Vozes: Rio Janeiro.

Robert ABRAMSON –(1980) Dalcroze-Based Improvisation, Music Educators Journal.SCHAFER, Murray (1986) O ouvido Pensante. Ed. Unesp: São Paulo. 

YEPES, Antonio (1968) Introducción al Método Coral Kodály Barry Editorial Com. Ind. S.R.L.: Buenos Aires.


Cadência de Concerto ou Cadencias são passagens escritas ou improvisadas, quase no final de andamento de concerto, em que é relevado o virtuosismo do solista.
Canção germânica por excelência. Atinge o seu auge a partir do séc. XVII, graças ao desenvolvimento paralelo que os intelectuais deram à sua poesia, começou a impor-se nos meios musicais, como forma de arte digna de consideração. No séc. XIX, Schubert consagra e vitaliza este género, seguiram-lhe os passos outros compositores como Liszt, Schumann, Mendelsshon, Hugo Wolf e Brahms.

 

Escrito por Levi Leonido Da Silva
Desde Argentina
Fecha de publicación: Enero del 2008.
Artículo que vió la luz en la revista nº 0006 de Sinfonía Virtual.


 

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